Hoje pela
manhã, os céus do Nepal estavam azul anil, de fazer inveja ao céu do Brasil,
sem uma nuvem. Eles saíram cedo para Nagarkot, um ponto de observação das
montanhas que compõem o Himalaia. Após um percurso maravilhoso de subida, a
turma chegou na torre de Nagarkot. Pela primeira vez em várias semanas, era possível
a observação de uma vista de 360° de cordilheira, e ver todo o vale em direção a
Katmandu. Nem os nepaleses, nem o Flavio e sua colega acreditavam no que
estavam vendo. Brincando, o Flavio comentou com o pessoal quem sabe Sidarta
tinha organizado o cenário. Mal sabe ele....As coisas estavam indo bem, mas
faltava o principal.
No caminho
de volta, a idéia era parar em Bhaktapur, uma das cidades sagradas do Nepal,
gravemente atingida pelo terremoto. Isto era central no meu plano, mas eu
precisava organizar bem as coisas. Meu mensageiro somente estaria disponível a
partir de meio-dia, e o acompanhante do Flavio estava com muita pressa de
voltar para Katmandu e visitar o templo crematório, o que também estava nos
meus planos. Ele havia marcado o almoço, em um restaurante familiar de beira de
estrada, com uma só mesa, para as 10 horas da manhã, hora comum de se comer no
Nepal. Mas isto acabaria levando a um desencontro fatal, e meu plano iria por
agua abaixo, sem monções.
Mas eu dei
um jeitinho... Dei uma desreguladinha no ponteiro do combustível, o que foi o
suficiente para atrasá-los mais ou menos uma hora para o almoço, e portanto,
para a visita a Bhaktapur. Mas não pensem mal de mim. Eles ficaram parados em
um lugar lindo com uma vista maravilhosa, e seguiram viagem sem
transtorno....maior.
Mas o tal
de individuo acompanhante continuou tentando atrapalhar meus planos. Ele tentou
convencer o Flavio a não visitar a cidade, porque tudo teria sido destruído. E propôs
que ao invés, fossemos visitar o acampamento dos atingidos pelo terremoto, que
ainda continuam em tendas, três meses após o mesmo. Mas tudo correu como eu
havia planejado: eles não entraram pelo portão principal da cidade, o que teria
me atrapalhado muito, e a pessoa que os levou ao acampamento era meu mensageiro,
com quem o Flavio tinha prometido a se encontrar caso viesse ao Nepal.
A visita ao
acampamento foi rápida devido a um conflito que havia acabado de ocorrer entre
os acampados e a administração do campo, o que dificultou uma conversa mais
aberta com os afetados. Como sobrou tempo, meu mensageiro propôs que o grupo
desse uma olhada pelo menos em alguns templos importantes da cidade, que
ficavam fora da área que exige o pagamento de ingressos. Finalmente, as coisas
estavam chegando aonde eu queria.
Templo de Indrayeni |
Eu estava tão
ansiosa que não conseguia controlar minhas cores, e todos os Kurtas e Saris das
nepalesas que passavam com seus cestos de mantimentos e com suas crianças com
uniforme escolar impecável pareciam se incendiar, ao sol de uma hora da tarde, irradiando
as brilhantes cores do arco-íris. Eles foram subindo lentamente do acampamento
dos afetados em direção a uma porta secundária que levava a zona central da
cidade. Após andar uns cem metros, meu mensageiro mostrou uma construção pequena,
a direita do caminho, edificada sob uma árvore sagrada e disse: este é o templo
da Deusa Indrayeni, rainha dos céus, que usa o arco-íris como arco para lançar
raios, trovoes e temporais, ou mesmo para seu transporte.
O Flavio
olhou na minha direção, como se estivesse me vendo e vi lágrimas brotar dos
seus olhos, e fiquei triste. Não era isso que eu queria causar, só queria que
ele lembrasse de nossa historia no Nepal, há muito tempo, quando nos conhecemos
em meio às montanhas, trabalhando os campos, cuidando de búfalos e cabras, e
nos amando como sempre nos amamos, pelas ruas de Bhaktapur. Queria mostrar para
ele que o amor é eterno para além desta vida, porque vida não tem começo, meio
ou fim, só nossos corpos.
Continua...
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