29 de jan. de 2013

A Senhorinha

No trem, havia uma Senhora sentada ao lado do corredor, quase a minha frente. Eu, como sempre, viajava na janela, na espreita da paisagem, que (des)aparecia na mesma velocidade do trem.
A Senhorinha me chamou atenção, na verdade acho que primeiro foi o casaco. Era bonito, vermelho vinho e preto.

Sentada a minha frente, uma Senhora lia jornal.
Abri meu livro, precisava ler alguma coisa também. Mas logo tive que parar a leitura, pois a cobradora pedia minha passagem.
Aí, meu olhos pararam na Senhorinha de casaco vermelho e preto mais uma vez. Passei a observa-la discretamente.

A Senhorinha era muito elegante, cabelos brancos bem penteados, não sei se no efeito da escova ou de bobes.
Uma maquiagem suave e sem preocupação em esconder as linhas do tempo, da vida.
No pescoço, um lenço bege perolado, talvez para se proteger de alguma friagem, ou apenas para dá um toque especial.
Na mão da Senhorinha, um celular. Um celular pequeno, mas era um celular.
Pronto, as letras do meu livro já não eram mais importantes.
Meu olhos e pensamentos estavam naquela Senhorinha, elegante e moderna, que escrevia e lia mensagens no celular.

Na mão direita uma bracelete bem trabalhado que entrelaçava duas cores, mas o brilho dourado ofuscava o branco-prateado, acho que era ouro.
Ela me olhou de repente, fiquei sem graça. Baixei a cabeça humilde e meu olhos voltaram para o livro esquecido nas minhas mãos.

O trem parou no meio do caminho. O condutor disse que havia problemas, e que não íamos chegar na hora planejada, precisávamos esperar mais um pouco.
Meus olhos que estavam no livro, foram para a paisagem da janela e, voltaram para a Senhorinha . Dessa a vez a culpa foi dela.
A Senhorinha abriu a bolsa, e em tom baixo, mas que meu ouvido captou, ela disse para a pessoa do outro lado da linha:
- Comece seu café da manhã, o trem atrasou e não chegarei a tempo.
Ela guardou o celular em uma bolsa pequena preta. Notei que era quadrada, de alças, da moda.

Antes mesmo do trem chegar no destino final, ela já estava de pé, inquieta. O trem parou e ela com sua malinha pequena e uma sombrinha foi andando em direção a porta de saída.
Quando desci do trem, fui caminhando pela estação, olhando para um lado, para outro, confesso, procurava pela Senhorinha, mas ela já havia desaparecido no meio da multidão.

Ah, aquela elegante Senhorinha de casaco vermelho e preto ficou no meu pensamento....
Para quem teria telefonado?
Para onde ia?
Iria encontrar um novo ou antigo amor?
Será que um dia eu  serei, uma Senhorinha elegante, moderna e viajadeira?

4 Comente aqui:

Rosângela da Luz Matos disse...

Adoro ouvir histórias.
Gosto de abrir o e-mail, ler as msg e fico meio sem saber o que fazer logo a seguir. Em seguida me dou conta de que eu gosto de ouvir histórias, saber o que se esta passando aqui ou alí.
Hoje encontrei a sua história.
Me inspirou. Acho até que vc anda meio Baudelaire:
A uma passante
A rua em torno um frenético alarido
Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa,
Uma mulher passou, com sua mão suntuosa

Erguendo e sacudindo a barra do vestido.
Pernas de estátua, era-lhe a imagem nobre e fina.
Qual bizarro basbaque, afoito eu lhe bebia
No olhar, céu lívido onde aflora a ventania,

A doçura que envolve e o prazer que assassina.
Que luz...e a noite após! Efêmera beldade
Cujos olhos me fazem nascer outra vez,
Não mais hei de ter senão na eternidade?

Longe daqui! tarde demais! nunca talvez!
Pois de ti já me fui, de mim tu já fugiste,
Tu que eu teria amado, ó tu que bem o viste!

(BAUDELAIRE, apud BENJAMIN:2000 p.42)

Bjs,

Anônimo disse...

Um post lindo, leve e solto, exatamente como essa senhorinha, aparentemente muito sabia, de bem com a vida e a vida sorrindo para ela...LG

Camille disse...

Historia bem contada, de escritora. Se não fosse seu olhar, ela existiria, mas de outra maneira. Provavelmente menos interessante. "Só" a vida de uma senhorinha. Quem olha e vê, engrandece o evento. Você será sim, uma senhorinha elegante, moderna, viajadeira, obsrvadora e boa escritora. Tudo que você já, sem ser ainda uma senhorinha. Será. E muito mais ainda. Bjos. Adorei.

Elaine Pasquim disse...

Tá virando escritora mesmo, acho que seus textos estão cada vez melhores e trazem toda a sensibilidade do momento que passou! Também acho q vc vai ser chique igual a Senhorinha. Bjs